Em 31 de outubro comemora-se a
festa de Santo Afonso Rodrigues, confessor. Sobre ele, Schamoni, em seu livro A
verdadeira fisionomia dos Santos, dá as seguintes notas:
Porteiro d convento durante 45
anos
Santo Afonso Rodrigues nasceu
no ano de 1531, em Segóvia. Era filho de um piedoso negociante.
Deve considerar-se como
transcendental em sua vida a influência do Bem-aventurado Padre Fábio, que
durante algum tempo viveu entre eles, assim como mais tarde o santo religioso
Francisco de Vilanova.
Com a morte de seu pai, Santo
Afonso passou a cuidar dos negócios familiares, porém a sua pouca habilidade levou
os negócios à falência, ao mesmo tempo em que a morte arrebatava a sua esposa,
seus filhos e sua mãe.
“Na desgraça — disse o Santo —
vi a majestade de Deus e reconheci a maldade de minha vida. Fizera, por causa
do mundo, pouco caso de Deus e agora estava na iminência de perder-me
eternamente. Ante mim vi a sublime grandeza de Deus, enquanto eu jazia no pó da
minha própria miséria. Imaginei ser um segundo Davi, e um comovedor Miserere
foi a expressão do meu estado de espírito.”
Dirigiu-se então à Companhia de
Jesus e, depois de seis meses de noviciado, mandaram-no para o colégio de Monte
Sion, em Palma de Mallorca, de cujo convento foi irmão porteiro durante quarenta
e cinco anos.
Doutor de Mallorca
A confiança que sua conduta
despertava contribuiu para que muitas pessoas a ele acudissem, pedindo conselhos
e ajuda em seus conflitos espirituais. Santo Afonso possuía em especial o dom
da conversa espiritual. Seu próprio reitor concordou que nenhum tratado
religioso lhe proporcionara tanto bem como o contato com o irmão leigo. Atendia
também os pedidos que lhe faziam através de numerosas correspondências. Por
isto foi chamado o “Doutor de Mallorca”.
O Santo podia ter dado bons
conselhos porque ele mesmo precisou suportar numerosas dificuldades íntimas e materiais
e enfrentar duras batalhas.
“Sentia — comentou — cada vez
com maior profundidade a grandeza do Senhor enquanto se aguçava em mim a
consciência da debilidade do meu ser Graças a esta experiência, mergulhava no
estado de absoluta inconsciência. Então só sabia amar.”
Três dias antes de sua morte,
depois da sua última Comunhão, permaneceu iluminado e em êxtase.
“Que felicidade — escreveu uma
testemunha ocular — despertava em nosso espírito ao contemplá-lo! E eram
somente algumas migalhas da sua felicidade. Decidimos chamar um pintor para que
fizesse um fiel retrato de Afonso”
O Santo faleceu em 31 de
Outubro de 1617.
Sua cadeira porteiro tornou-se um trono de sabedoria
Esta é uma vida verdadeiramente
magnífica porque traz três notas muito importantes.
A primeira delas costuma ser
comentada a propósito da vida de Santo Afonso Rodrigues, e é digna de ser
recordada: este Santo fez um bem imenso a toda a Espanha, a todo o mundo, e
conseguiu realizar este bem num posto humílimo. Ele era porteiro de um convento
numa ilha que, naquele tempo, tinha comunicação difícil com o continente, e
ficava muito mais isolada do que está hoje. Ali ele consumiu 45 anos de sua
existência.
Pois bem, apesar de estar nesse
recanto, o bom odor de Jesus Cristo que havia nele espalhou-se por toda a ilha
de Palma de Mallorca, depois pela Espanha, e mais tarde pelo mundo, com a
figura venerável deste porteiro velho, acolhedor, afável, sempre ao alcance de
todo mundo na portaria e, portanto, podendo ser consultado por todos os que
quisessem, o que fez de sua cadeira de porteiro um trono da sabedoria. Todos
iam lá vê-lo e ouvi-lo.
Vemos o que há de magnífico
numa vida mesmo muito humilde como esta, quando é toda integrada e empregada no
serviço de Deus Nosso Senhor e da Santa Igreja Católica. Por quê? Porque a
santidade, a sabedoria tem uma irradiação própria, que não é comparável a nada.
Não é tão importante que o Santo esteja num lugar onde todos veem porque para
atrair, quer o afeto, quer a admiração, em qualquer lugar onde ele esteja este
afeto e esta admiração confluem. Basta que seja um Santo verdadeiro e autêntico,
com uma santidade, como diziam os antigos,
victa et non picta. quer dizer, verdadeira e não pintada.
Com essa consideração devemos
fazer duas outras, que me parecem bem mais importantes.
Considerar a grandeza divina
O modo pelo qual este Santo foi
chamado a contemplar a Deus Nosso Senhor fala muito à minha alma. Considerar a
grandeza divina: Deus infinitamente grandioso, majestoso, sábio, transcendente a
tudo, excelente, magnífico, sublime, radioso, absoluto em toda a sua essência, misterioso,
insondável!
Quando percorremos com o olhar
das as coisas e as analisamos, acabamos descobrindo tal insuficiência, tal
debilidade, que chegamos à seguinte conclusão: ou valem porque são um reflexo
de Deus, ou não são absolutamente nada,
Chegou a me passar pela mente o
que eu faria de minha vida se não cresse em
Deus. Sentiria, ao cabo de algum
tempo, uma insipidez, uma sensação de vazio... Por exemplo, diante de um belo
objeto. Aqui está esta peça de ouro, está hem, mas o que importa? Custa muito? Sim,
porém o que me interessa? Satisfaz as minhas necessidades? Suponhamos que sim.
E do que me adianta satisfazer minhas necessidades? Prolongar esta vida para
quê? Tudo isto não é nada!
Mas se eu tomo em consideração
que isso tudo não é senão um véu por detrás do qual está o Ser absoluto,
perfeito, eterno, sapientíssimo, sublime, transcendente, então encontro algo
que é inteiramente superior a todos os homens, a mim, aos que me rodeiam, e no
qual as minhas vistas exaustas e maravilhadas podem repousar. Afinal encontrei
algo inteiramente digno de ser visto, amado, e de que a Ele eu me dedique
completamente. E isto por causa da grandeza d’Ele. Porque Ele não é uma simples
criatura concebida no pecado como eu, mas é o próprio Criador perfeitíssimo!
Agora a vida tomou sentido, a
existência é alguma coisa! A grandeza de Deus me ergueu do pó e me deu o desejo
das coisas infinitas.
Jesus Cristo concentra todas as formas e matizes de grandeza
Este homem, este Santo, na
consideração da grandeza de Deus, subiu alto, e até o fim da vida dele se
arrependia dos seus pecados, e desejava ir para o Céu a fim de conhecer essa
infinita grandeza.
Confesso, francamente, que me é
impossível pensar nisto sem sentir uma grande alegria dentro de minha alma.
Muitos morrem com medo de pensar na grandeza de Deus. Eu, pelo contrário, tenho
a impressão de que, se Nossa Senhora me ajudar — e não duvido que me ajudará —,
na hora da minha morte morrerei radioso, com a ideia de que, afinal de contas,
vou encontrar a grandeza de Deus, vou me libertar do cárcere de todas as
limitações, de todas as mesquinharias, de todas as pequenezes, de todas as
contingências, para encontrar a Deus Nosso Senhor infinitamente grande. Senhor meu,
Pai meu, Rei meu, tão grande, que nem sequer, apesar da visão beatífica,
poderei dispensar um intermediário junto a Ele.
Então eu terei a Nosso Senhor
Jesus Cristo, o Verbo de Deus encarnado.
Uma forma de grandeza... quando
se fala as palavras Jesus Cristo, todas as formas, todos os sons, todos os matizes
de grandeza se concentram ali de um modo superlativo. E logo junto a Nosso
Senhor Jesus Cristo, infinitamente abaixo d’Ele e incomensuravelmente acima de mim,
Nossa Senhora, Rainha de uma majestade insondável.
Então, o que sou eu? Uma
poeira, um grão de areia perdido no meio disto tudo. Pois bem, me enche a alma
a ideia de que não sou senão um grão de areia, uma poeira, mas que existe
aquilo, que eu vou para aquilo, que eu me reúno àquilo e aquilo me acolhe, me
aceita, me envolve, e eu passo ali a eternidade inteira. Confesso que é nesta
consideração que a minha alma se dilata.
Não será talvez assim para
outras pessoas. Mas há várias moradas no Céu. Que a misericórdia me receba
nessa morada, porque para ela eu sinto uma atração superlativa.
Plinio Correa de Oliveira
–Extraído de conferência de 30/10/1967
1) Não dispomos dos dados
bibliográficos da referida obra.
2) Canonizado em 9 de outubro
de 1977.
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