Foi por aclamação
popular que Santo Ambrósio ascendeu à dignidade episcopal: “vox populi, vox
Dei”.
A respeito de Santo Ambrósio,
Bispo, Confessor e Doutor da Igreja, Dom Guéranger fornece alguns traços
biográficos:
Ainda
adolescente, Ambrósio apresentava gravemente sua mão para ser osculada por sua
mãe e sua irmã porque, dizia ele: “Esta mão será um dia a de um Bispo”.
Vemos o que é a compenetração
da dignidade episcopal: Como essa mão viria a ser um dia a de um Bispo, beije-a
desde já. E fazia isso não por vaidade, nem por orgulho, mas por amor à
dignidade episcopal. É realmente magnífico!
A honra de pertencer à Igreja
Pode-se
crer que se a vontade divina não tivesse irrevogavelmente condenado o Império
Romano a perecer, influências como as de Ambrósio, exercidas sobre um príncipe
de coração reto, teriam evitado sua ruína. Sua máxima era firme, mas ela não
devia ser aplicada senão nas sociedades novas, que surgiriam depois da queda do
Império.
Santo Ambrósio dizia: Não há
titulo mais honroso para um imperador do que “filho da Igreja”. O imperador é
membro da Igreja, e não está acima dela.
Santo Ambrósio e outros
Doutores da Igreja precisaram lutar contra uma tradição que permaneceu entre os
imperadores romanos cristãos, a qual procedia do tempo do paganismo.
Na época do paganismo clássico,
não havia propriamente uma igreja pagã, nem a distinção entre as duas
sociedades, igreja e Estado, como Nosso Senhor Jesus Cristo instituiu. Mas o
Estado pagão era um Estado-igreja, que, ao mesmo tempo, promovia a vida
temporal, o culto e dispunha a respeito de todos os assuntos religiosos. De
maneira que os imperadores romanos habitualmente se consideravam chefes da
religião. E, quando eles morriam, eram até “deificados”, elevados à condição de
deuses.
Quando surgiu o Cristianismo,
muitos imperadores romanos, por hábito mental, se consideravam os chefes da
Religião Católica, dando origem a enormes atritos, como o de Santo Ambrósio com
o Imperador Teodósio.
É conhecido o fato de que o
Imperador Teodósio, não querendo subordinar-se à ordem de Santo Ambrósio, Bispo
de Milão, foi à igreja, acompanhado de todo o seu séquito, depois de ter sido
excomungado. Ele encontrou Santo Ambrósio com seu clero na entrada do templo,
que lhe proibiu entrar. E Teodósio retrocedeu.
Então, Dom Guéranger comenta
esta máxima de Santo Ambrósio: “Nada é mais honroso para o imperador do que ser
filho da Igreja. O imperador está na Igreja, e não acima da Igreja.”
Quer dizer, para o imperador o
grande título de honra é o de católico. Por isso, após a queda do Império
Romano, os soberanos católicos colocavam toda a sua honra em ligar seus cargos
a títulos religiosos. Assim surgiram o Sacro Império Romano Alemão e os títulos
de Rei Apostólico para os reis da Hungria; Rei Cristianíssimo aos da França;
Defensor da Fé, concedido a Henrique VIII da Inglaterra, antes de ele
apostatar; Reis Católicos aos soberanos da Espanha; Rei Fidelíssimo ao monarca
de Portugal.
É bonita a observação feita por
Dom Guéranger, pois o título imperial ou real, que é o mais alto dos títulos
humanos, vale pouco se não vem conjugado de alguma forma com a Igreja Católica.
Entusiasta da virgindade
Santo
Ambrósio é um dos Padres do quarto século que mais vivamente exprimiu as
grandezas do ministério na pessoa de Maria. Esta terna predileção por Nossa
Senhora explica o entusiasmo de que Ambrósio estava repleto pela virgindade
cristã, da qual ele merece ser considerado o doutor especial. Nenhum dos Padres
o igualou no encanto e na eloquência com os quais ele proclamou a dignidade e a
felicidade das virgens.
Esse é um lindo título que cabe
a Santo Ambrósio. De todos os Doutores da Igreja, foi o que melhor estudou a
virtude da virgindade; aquele que, com delicadeza de linguagem e de alma
inexcedível, soube tratar do tema de maneira a não só firmar a convicção de que
a virgindade é uma virtude excelsa, mas ainda proporcionar uma verdadeira
apetência da virgindade. Valeria a pena, algum dia, comentarmos aqui os sermões
de Santo Ambrósio sobre a virgindade; é tudo quanto há de mais belo.
Zeloso pela dignidade externa
Santo
Ambrósio preocupava-se com que os ministros da Igreja apresentassem grande
dignidade externamente. Não aceitava em seu clero quem não tivesse uma presença
respeitosa. Assim, não admitiu um seu amigo porque notou em seu modo de andar
algo menos próprio.
Conheço o caso de uma senhora,
cujo filho estava querendo ser padre. Certa vez ela entrou num bonde e viu um padre
tão sujo de tabaco, com o cabelo tão despenteado, que essa senhora disse o
seguinte: “Meu filho jamais será padre.”
Era um raciocínio errado, mas com
certo fundo de razão. Quer dizer, se numa classe os homens se apresentam assim,
não convém pertencer a essa classe. A ideia é muito verdadeira: quando uma
pessoa é altamente respeitável, até no seu físico uma respeitabilidade
transparece. Compreende-se, portanto, como Santo Ambrósio tinha profundamente razão.
Apostolado de presença
Santo
Ambrósio combateu os hereges e converteu Santo Agostinho.
Santo Agostinho conta que ele
tinha verdadeira fascinação por Santo Ambrósio. Então, de vez em quando, ele ia
à casa do santo Bispo de Milão, metia-se na sala onde ele estava escrevendo e
ficava sentado, na esperança de que Santo Ambrósio lhe dissesse alguma palavra.
E Santo Ambrósio, muito ocupado com os trabalhos, não dava entrada a Santo Agostinho.
Mas, pelo fato de ver Santo Ambrósio trabalhar, estar ali na atmosfera criada
pelo Bispo de Milão, ele sentia que aquilo fazia muito bem para sua alma.
Por isso, e devido a alguns
colóquios que eles tiveram, bem como por causa das obras de Santo Ambrósio, algumas
das quais Santo Agostinho conheceu antes da conversão, se pode dizer que Santo
Ambrósio cooperou constantemente para esse fato que talvez seja o mais
importante da sua vida: não foram os livros que ele escreveu, nem as obras que
realizou, mas ter convertido Santo Agostinho. Somente essa conversão é um
capítulo na História do mundo e na História da Igreja.
Vemos aqui duas coisas bonitas
em Santo Ambrósio: em primeiro lugar, o apostolado de presença.
Insistimos tanto sobre o
alcance desse apostolado. Muitas pessoas pensam que Zeloso pela valem para o
nosso Movimento na medida em que falam, atuam, trabalham. Claro está que isso
tudo é muito bom. Mas há um apostolado de presença, que pode ser muito melhor;
e desse fato deu provas muito eloquentes Santo Ambrósio em face de Santo
Agostinho.
De outro lado, notamos a
confiança na Providência Divina. Se Santo Ambrósio fosse superficial, ele
cessaria todos seus trabalhos para fazer uma pescaria apostólica com Santo
Agostinho. Depois ele iria trabalhar desordenadamente; pior, minguaria seus
livros e escreveria uns livrequinhos superficiais, para ter tempo de conversar com
Santo Agostinho.
Porém, confiante na
Providência, no amor de Deus, na Igreja Católica, ele fazia o que estava dentro
de suas possibilidades. Era vontade de Deus que Santo Ambrósio escrevesse um livro,
e ele o fazia com perfeição. E que Santo Agostinho aproveitasse as beiradas que
encontrasse; Deus haveria de prover. E, de fato, proveu.
Quer dizer, essa confiança na
Providência, não querer fazer loucuras, absurdos, mas ser temperante, inclusive
no próprio zelo apostólico, é rica em lições para nós.
Plinio Correa de Oliveira – Extraído
de conferências de 7/12/1964 e 6/12/1966
Vox populi, vox Dei
(L’Année
liturgique - première section: L’Avant. Dom Prosper Guéranger.)
Santo Ambrósio encontrava-se na
cidade de Milão, revestido da autoridade de seu cargo, na ocasião em que o povo
desentendia-se no tocante à eleição do sucessor do falecido bispo ariano
Auxence.
Ambrósio dirigiu-se, pois, à
igreja para cumprir suas obrigações de ofício e procurar acalmar a sedição que
estava se montando.
Entretanto, após um discurso
eloquente, no qual abordava longamente a conveniência da paz e da tranquilidade
nas coisas públicas, repentinamente uma criança gritou: “Ambrósio Bispo!” Ao
que todo o povo respondeu igualmente com “Ambrósio Bispo!”, manifestando assim
seu apoio a esta escolha.
Como Ambrósio recusasse esta
dignidade, resistindo aos desejos da assembleia, o voto ardoroso do povo foi
transmitido ao Imperador Valentiniano, que ficou muito agradado de que os
magistrados de sua escolha fossem elevados às honras do sacerdócio.
O Prefeito Probus não ficou
menos agradado. Quando da saída de Ambrósio, ele tinha lhe dito, como se fora
um pressentimento profético: “Ide e agi, não enquanto Juiz, mas como Bispo.”
Assim, a vontade imperial e a
voz do povo estando unidas, Ambrósio foi batizado (pois que era ainda
catecúmeno), recebeu as ordens sacras, passou por todas as etapas prescritas
pela disciplina da Igreja, e oito dias após sua eleição, a sete de dezembro,
recebeu o encargo episcopal.
Como Bispo, foi um intrépido
campeão da Fé e da disciplina eclesiástica, trouxe de volta à verdade da Fé
muitos arianos e outros hereges, entre os quais gerou para Jesus Cristo Santo
Agostinho, tocha sagrada da Igreja.
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