Ao celebrarmos as
excelsas virtudes de São José, talvez conviesse salientarmos, primeiramente, um
aspecto da vida do glorioso patriarca pouco ressaltado nos comentários que
sobre ele temos lido.
A glória de ter sido recusado
Refiro-me ao fato de
ele, ao procurar um abrigo para Nossa Senhora prestes a dar à luz o seu divino
Filho, ver que lhes recusavam lugar nas hospedarias de Belém. São José,
Príncipe da Casa de David, nobre da família real ao mesmo tempo deposta e no
seu apogeu, pois dela ia nascer o esperado das nações, bate às portas e é
rechaçado. Despedem a quem representava algo que a mediocridade de alguns
homens sempre rejeitou, ou seja, a distinção, a majestade, enfim porque
simbolizava a grandeza e a sublimidade do próprio Verbo Encarnado que Maria
Santíssima trazia consigo.
Foi esta a primeira
glória de São José, sua especial bem-aventurança de ter sido recusado no
momento mais augusto da História. Nesse sentido, prenunciava em sua pessoa a
renúncia tão mais acerba que Nosso Senhor Jesus Cristo sofreria mais tarde,
culminando na crucifixão e morte no Calvário.
Logo depois, teve São
José a glória de conduzir Nossa Senhora aos arredores de Belém, e de com Ela se
refugiar num lugar ermo, numa gruta que servia de habitação aos animais. Ali A
acomodou e ali esteve, por amor à virtude, sozinho e abandonado dos outros
homens. Ali também foi-lhe dada a suprema dita de presenciar o nascimento do
Salvador.
A partir de então
podemos dizer que as glórias se acumulam sobre São José, mas — oh! paradoxo! —
quase todas negativas. Por exemplo, a de ser um homem apagado, do qual não se
fala, ou a ele se referem com menosprezo. “Este (diziam os que motejavam de
Nosso Senhor) não é filho daquele carpinteiro? Um filho de mero carpinteiro não
pode ser Deus”. O que significa tomar São José como um fator de descrédito para
o próprio Messias.
Os evangelistas são
lacônicos ao mencionarem a figura do pai do Menino Jesus. Sobre ele pouco se
sabe. Transparece nesse quase anonimato a glória daquele que padeceu,
previamente, as humilhações e todo o peso da renúncia que devia cair sobre
Nosso Senhor.
Bem-aventurado São
José, que sofreu por amor à justiça, assim como bem-aventurado porque nele se
cumpriam todas as bem-aventuranças que o Divino Mestre enumerou no sermão da
montanha. Varão bem-aventurado entre os homens, abaixo do próprio Jesus e de
Maria Santíssima, limpo de coração como nenhum outro, porque esposo virginal da
Virgem por excelência.
Único homem à altura de Maria
Esposo de Nossa
Senhora! Todos os louvores e exaltações, todas as enaltecedoras palavras sobre
São José não podem dizer tanto quanto a simples afirmação de que ele foi o
esposo de Maria e o pai adotivo do Menino Jesus.
Compreende-se que a
Divina Providência, ao eleger a mãe do Verbo Encarnado, adornou-a de qualidades
e atributos insondáveis inerentes a tão excelsa prerrogativa. Donde excederem a
toda capacidade de intelecção humana o conceber os limites desses atributos e
qualidades existentes na pessoa de Maria Santíssima. Ela é, inconteste, a mais
perfeita dentre as simples criaturas. Se tomarmos a soma das excelências de
todos os anjos e de todos os homens que já existiram, existem e existirão na
face da Terra, não teríamos sequer pálida ideia da perfeição da Mãe de Nosso
Senhor Jesus Cristo.
Ora, então
pergunta-se: se Deus foi tão magnificente no predestinar e modelar a mulher que
daria ao mundo o Salvador, e em cumulá-la das mais preciosas graças, seria Ele
menos pródigo no escolher o homem que deveria ser o esposo dessa Virgem e dessa
Mãe?
Evidentemente não. Um
homem tinha de ser considerado proporcionado a essa esposa: por seu amor a
Deus, pela sua justiça, pureza, sabedoria e todas as demais qualidades. Esse
homem, escolhido por tal adequação à pessoa de Nossa Senhora, foi São José.
Proporcionado ao Filho
Em segundo lugar, o
pai deve ser proporcionado ao filho. E só nesse aspecto a grandeza de São José
se nos apresenta indizível. Cumpria que o homem escolhido para tal missão a
desempenhasse com incomparável dignidade, e assumisse a posição de verdadeiro
pai do Redentor, mostrando-se à altura d’Ele. São José foi este homem. Estava
na proporção de Jesus Cristo, assim como estava na proporção de Nossa Senhora.
Para formarmos alguma
ideia do que representa essa maravilhosa condição de pai e protetor do Verbo
Encarnado, pensemos, por exemplo, nas imagens de Santo Antônio que se veneram
em certos altares: o santo traz em seu braço o Menino Jesus, e para este dirige
um olhar embevecido, repassado de uma felicidade imensa porque, em razão de um
milagre, teve o Filho de Deus em seus braços durante alguns instantes. E nós,
do nosso lado, fitamos a imagem igualmente embevecidos, exclamando em nosso
interior: “Feliz Santo Antônio, ao qual foi dada essa honra inefável de
carregar o Menino-Deus”.
Ora, quantas vezes
São José terá conduzido o Divino Infante em seus braços? Dias, meses, anos ele
O viu crescer, rezar, praticar todos os atos de sua vida comum. Ouvi-O, e teve,
ele mesmo, os lábios suficientemente puros e a humildade suficientemente grande
para fazer essa coisa formidável: responder a Deus, dar ao Menino os conselhos
que Este lhe pedia, sabendo que era a criatura aconselhando o Criador...
Vemos, então, essa
glória única de São José, a de ser o homem capaz de governar a Sagrada Família,
de cuidar das necessidades terrenas de Nossa Senhora e de Jesus Cristo,
inteiramente adequado e proporcionado à altura dessa dignidade.
Modelo de devoção mariana
Devemos acrescentar a
tais excelências essa outra: São José é o modelo do devoto mariano. Com efeito,
ninguém representa melhor a devoção a Nossa Senhora do que o homem escolhido
para ser seu esposo, aquele que — podemos imaginar — A contemplava
continuamente, admirando-A nos seus gestos e nas suas palavras, haurindo dessa
contemplação ricas lições de sabedoria, recebendo a propósito dela graças
extraordinárias, e a todo momento conformando sua alma à d’Ela.
Por isso mesmo, além
de perfeito devoto de Nossa Senhora, São José é também o modelo do espírito
contemplativo, do espírito afeito ao cultivo da vida interior, para o qual
elevar-se às altas cogitações e considerar todas as coisas em função de Deus
constitui a genuína felicidade de sua existência. Glorioso São José, modelo de
sabedoria, de força, de pureza.
A verdadeira face de São José
Concluo esses
comentários com uma ponderação colateral, porém a meu ver oportuna.
Não raro nos
deparamos com gravuras e imagens que representam São José com um perfil moral
muito aquém de todas essas excelsas qualidades e virtudes que acima
salientamos. Donde me parecer não devermos aceitá-las como legítimas
manifestações da verdadeira personalidade do pai de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Creio que, para se
ter alguma ideia do semblante espiritual de São José, seria preciso deduzir, à
maneira de suposição, o caráter de um homem que esteve à altura de ser o pai
d’Aquele cuja Sagrada Face está estampada no Santo Sudário de Turim. Quer
dizer, o homem que foi o educador, o guia, o protetor do senhor daquele rosto
impresso no sudário; um homem que foi da mesma linhagem, parente e esposo da
Mãe d’Ele.
Conceber algo menor
que isso é não ter ideia da extraordinária figura de São José, modelo de
fisionomia sapiencial porque consorte da Sede da Sabedoria, do Espelho da
Justiça, Maria Santíssima. Modelo de fortaleza, porque pai do Leão de Judá,
Nosso Senhor Jesus Cristo.
A este verdadeiro São
José devemos elevar nossas preces, rogando-lhe interceda por nós junto à Virgem
Santíssima e a seu Divino Filho, e nos alcance a graça de o imitarmos nas suas
magníficas virtudes.
Plinio Correa de
Oliveira – Extraído de conferências em 19/3/1966 e 18/3/1967
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