Antes de seu batismo chamava-se “Reprovado”, depois recebeu o
nome de Cristóvão, porque ele levou o Cristo de quatro formas: sobre seus
ombros, para o fazer passar pelo rio; em seu corpo, pela mortificação; em seu
coração pela devoção e sobre seus lábios pela confissão e pregação.
Sua
festa é comemorada no dia 25 de julho e seu martírio deu-se no ano de 254, na
cidade de Lícia.
Cristóvão
era um homem gigantesco e de um terrível aspecto.
Um
dia, em que ele se encontrava junto de um rei, lhe veio ao espírito o desejo de
procurar o maior príncipe do mundo e de permanecer junto dele a seu serviço.
Ele
se apresenta a um rei muito poderoso que tinha em toda parte a reputação de não
ter ninguém que o igualasse em grandeza. Vendo-o, o rei o acolheu com bondade e
o fez ficar em sua corte.
Ora,
certo dia um bulhão cantava em presença do rei uma canção onde freqüentemente
se repetia o nome do diabo; o rei, que era cristão, fazia um sinal da cruz,
cada vez que ouvia pronunciar esse horrível nome. Cristóvão notando isso, ficou
muito impressionado por esta ação e do significado de tal ato.
Interrogou
o rei sobre isto, mas este não queria lhe responder, furioso, disse Cristóvão:
-
Se vós não me disserdes, eu não ficarei mais convosco!
O
rei, constrangido e até com um certo medo, disse:
--
Eu me muno deste sinal, diante de algum diabo que eu ouço nomear, no temor de
que ele tome poder sobre mim e me prejudique.
Cristóvão
lhe respondeu:
-
Se vós temeis o diabo, é ele, evidentemente, maior e mais poderoso do que vós!
A prova é que vós tendes um terrível medo dele. Eu estou, portanto, bem enganado
em meu intento, eu pensava ter encontrado o maior e mais poderoso senhor do
mundo; mas agora eu vos dou adeus, pois eu quero procurar o próprio diabo e o
tomar por mestre e fazer-me seu servidor!
O
rei tentou de todas as maneiras dissuadi-lo de tal intento, mas Cristóvão, ou
melhor, o Reprovado, pôs termo à discussão com um grito:
-
Já estou decidido, é assim que vou fazer!
Reprovado
deixa o rei e começa a procurar o diabo.
Certo
dia, quando andava no meio de um deserto, ele viu uma enorme multidão de
soldados, do qual um, que tinha um aspecto feroz e terrível, veio em sua
direção e lhe perguntou para onde ia.
Reprovado
respondeu:
-
Estou procurando o senhor diabo, a fim de o tomar por mestre e senhor.
--
Pois bem, eu sou aquele que procuras!
O diabo foge da Cruz
Muito
contente, Reprovado o seguiu para ser seu servidor por todo o sempre e o tomou
por seu senhor.
Ora,
como eles marchavam juntos, eles passaram por uma cruz colocada sobre um
caminho público. Logo que o diabo a percebeu, ficou apavorado, fugiu a toda
pressa e deixando a estrada conduziu Reprovado por um caminho secundário e
acidentado; reconduzindo-o depois para a estrada.
O
gigante ficou impressionado pelo que viu, e perguntou porque ele tinha manifestado
tanto medo quando deixou estrada, para fazer um desvio e o reconduzir em
seguida ao mesmo caminho.
O
diabo não quis dar o motivo, Reprovado lhe diz:
-
Se vós não me dizeis, eu vos deixo neste instante!
O
diabo foi forçado a lhe dizer:
-
Um Homem que se chama Cristo foi pregado à cruz; quando eu vejo a imagem de sua
cruz, eu entro em tal pânico, que fujo apavorado!
-
Portanto este Cristo é maior e mais poderoso do que tu. Uma vez que tu tens um
tão grande medo vendo a imagem de sua cruz! Eu trabalhei, portanto, em vão, e
não encontrei ainda o maior príncipe do mundo. Então, adeus, eu quero te deixar
e procurar este Cristo.
*
Á procura de Cristo
Durante
muito tempo ele procura alguém que lhe desse as informações sobre o Cristo.
Um
dia, encontrou um respeitável eremita e lhe perguntou:
--
Você sabe quem é Cristo?
—
Mas como não hei de saber! Jesus Cristo... — e o piedoso eremita instruiu cuidadosamente
sobre a fé.
Encantado
com todas as explicações daquele santo homem, Reprovado, disse:
--
Eu quero servir, então, a este poderoso rei!
--
Este rei que tu desejas servir quer a tua submissão! Mas, será preciso que tu
jejues frequentemente.
--
Que Ele me peça outra coisa, porque me é absolutamente impossível fazer isto.
-- disse o gigante, já pensando na hora de alimentar-se.
--
Será preciso ainda, -- retomou o eremita -- lhe dirigir orações.
--
Eu não sei o que é isto, e não posso me submeter a esta exigência.
O
eremita lhe diz:
--
Tu conheces tal rio onde muitos dos que lá passam, estão em perigo de perder a
vida?
--
Sim. eu o conheço.
--
Como tu tens uma alta estatura e és forte e robusto, se tu ficasses junto deste
rio, e passasses todos aqueles que para ali forem, tu farias alguma coisa muito
agradável ao rei Jesus Cristo, que tanto desejas servir, e eu espero que ele se
manifeste a ti neste lugar.
Reprovado,
que já começava a se chamar Cristóvão, lhe diz:
--
Sim, eu bem posso fazer este trabalho, e eu prometo que o farei por Ele.
Foi
então até o rio indicado pelo eremita, e ali construiu um pequeno alojamento.
Ele trazia à mão, no lugar de bastão, uma vara com a qual se mantinha dentro da
água. O robusto gigante passava sem descanso todos os viajantes.
*
Um menino
Passaram-se
muitos dias, quando, urna vez ele ouviu a voz de uma criança que o chamava
dizendo:
--
Cristóvão, venha para fora e me passe.
Cristóvão
logo se levantou, mas não encontrou ninguém. Tendo voltado para sua casa ouviu
a mesma voz que o chamava. Ele novamente correu para fora e de novo não
encontrou ninguém.
Uma
terceira vez ele foi chamado como anteriormente, saiu e encontrou na margem do
rio urna criança que lhe pediu insistentemente sua ajuda. Então, Cristóvão
levantou a criança sobre seus ombros, tomou seu bastão e entrou no riopara o
atravessar. E eis que a água do rio começa a se encher pouco a pouco e o menino
começava a lhe pesar cada vez mais, como uma massa de chumbo: ele avançava e o
rio continuava a se encher: o menino pesava cada vez mais aos ombros do possante
Cristóvão, o peso já era intolerável, de modo que ele se achava em grandes
angústias e temia perecer.
Por
fim, escapou com enorme dificuldade; e quando transpôs o rio, depositou o
menino na margem e lhe disse:
—
Menino, tu me expusestes a um grande perigo e me pesaste tanto que se eu tivesse
tido o mundo inteiro sobre mim, eu não sei se teria tido mais peso para levar!
O
Menino lhe respondeu:
--
Não te espante Cristóvão, tu não tiveste somente o mundo todo sobre ti, mas
levaste sobre os ombros Aquele que criou o mundo! Pois “Eu Sou o Cristo” teu
Rei, a quem tens servido, e para te provar que digo a verdade, quando tu tiver repassado,
enfie teu bastão na terra em frente a tua casa, e de manhã verás que ele floresceu
e deu frutos.
No
mesmo instante desapareceu o Menino Jesus, e Cristóvão ficou maravilhado.
Tendo
chegado à porta de sua casa, Cristóvão enfiou seu bastão na terra. Pela manhã,
ao se levantar, a primeira coisa que fez foi ver o bastão e, admirado, viu que
em sua vara nascera folhas e tâmaras como numa palmeira. Procurou o santo eremita
e contou-lhe tudo o que havia acontecido. Entre lágrimas pediu o batismo.
Cristóvão vai para Lícia
Em
seguida, cheio do Espírito Santo, Cristóvão foi a Samos, cidade de Lícia, onde,
não compreendendo a língua falada por seus habitantes, pediu ao Senhor que lhe
desse inteligência. Enquanto permanecia em oração, os que o viam tomaram-no por
louco, e o deixaram.
Cristóvão
tendo obtido o que pedia, foi até o lugar onde os cristãos sofriam o rnartírio
e destemidamente a todos consolava e animava em meio aos tormentos.
Uni
soldado romano vendo que ele ajudava aos cristãos, bateu-lhe na face.
Cristóvão,
olhando-o firmemente, disse:
--
Se eu não fosse cristão, eu me vingaria imediatamente desta injúria!
Depois
empunhando seu bastão, crava-o na terra e pede ao Senhor que o fizesse
reverdecer para que com este milagre convertesse o povo.
Para
espanto de todos isto se fez no mesmo instante e oito mil pessoas se converteram.
Sabendo disso, o governador romano enviou duzentos soldados com ordem de
trazerem Cristóvão diante dele.
Milagres e
conversões operadas por São Cristóvão
Quando
chegaram no local onde estava, encontraram-no em oração e, por isso, os
soldados temeram de lhe notificar esta ordem: o governador enviou mais duzentos
homens, que também se colocaram a rezar com Cristóvão.
Ele
se levanta e lhes diz:
--
O que vós procurais?
Quando
viram sua face disseram timidannte:
--
O rei nos enviou para te prender e te conduzir a ele.
--
Se eu quisesse, vós não poderíeis me levar nem amarrado, nem livre.
--
Então, se tu não queres, vá livremente para onde bem queira e nós diremos ao
rei que não te encontrarnos.
--
Não, não será assim, eu irei convosco.
Então,
ele os converteu à fé de Cristo. Deixou que atassem suas mãos atrás das costas
e foi conduzido ao governador neste estado.
A
sua vista, o governador ficou tão assustado que caiu repentinamente de seu assento.
Levantado logo por seus servidores, lhe pergunta seu nome e sua pátria.
Cristóvão
lhe respondeu:
--
Antes de meu batismo, eu me chamava Reprovado, mas hoje tenho o nome de
Cristóvão.
O
governador lhe disse:
--
Tu te deste um nome tolo, tomando este do Cristo Crucificado, que não fez nenhum
bem e que não poderá te fazer nada. Agora, portanto, mau cananeu, por que não
sacrificas a nossos deuses?
Cristóvão
lhe disse:
--
E corn razão que te chamas Dagnus. (que signjfica condenado ou perigo), porque
tu és a morte do mundo, o associado do diabo: e teus deuses são a obra da mão
dos homens!
O
governador diz enraivecido:
--
Tu foste educado no meio dos animais ferozes: tu não podes, portanto, proferir
senão palavras selvagens e coisas desconhecidas dos homens. Agora, se tu queres
sacrificar, tu obterás de mim grandes honras, senão, tu perecerás nos suplícios.
Castidade
heroica de São Cristóvão
E
como o santo não quis sacrificar, Dagnos o fez meter na prisão; quanto aos soldados
que tinham sido enviados a Cristóvão ele os fez decapitar pelo nome de Jesus
Cristo. Em seguida, fez trancar com Cristóvão na prisão duas mulheres públicas
muito belas, da qual uma se chamava Nice e outra Aquiline, prometendo-lhes
grandes recompensas se o induzissem a pecar.
A
vista de tão terrível prova, Cristóvão se pôs em oração, mas como estas mulheres
o atormentavam, ele se levanta e lhes diz:
--
Que pretendes e por qual motivo vos introduzistes aqui?
Então,
apavoradas pelo brilho de sua face disseram:
—
Tende piedade de nós, santo homem, a fim de que possamos crer no Deus que vós
pregais.
O martírio de
Nice e Aquiline
O
governador informado disso, mandou chamar estas mulheres e lhes disse:
—
Vós também acreditastes neste homem!!! Eu juro pelos deuses que se vós não
sacrificardes, vós perecereis de morte trágica.
Elas
responderam:
-
Se tu queres que nós sacrifiquemos ordene que se limpe os lugares e que todo
mundo se reúna no templo.
Quando
isto foi feito e que elas foram introduzidas no templo, elas desataram suas
cintas, colocaram-nas no pescoço dos ídolos, derrubaram-nos e quebraram-nos, dizendo aos assistentes:
-
Ide chamar os médicos para curar vossos deuses!
Então
por ordem do governador. Aquiline é enforcada; depois se atou a seus pés uma
enorme pedra que deslocou todos seus membros. Quando ela entregou sua alma ao Senhor,
Nice, sua irmã, foi lançada no fogo. Milagrosamente o fogo não lhe fez mal
algum. O governador ordenou, então, que fosse decapitada.
Martírio de São
Cristóvão
Depois
disso, Cristóvão foi levado em presença do governador que o fez chicotear com varas
de ferro: um enorme capacete de ferro avermelhado no fogo foi colocado em sua
cabeça: o governador mandou preparar um banco de ferro e ordenou que o
amarrassem e que se ponha fogo, alimentado com piche. Mas o banco se derrete
como cera, e o santo sai são e salvo.
Ataram-no
a um tronco e o governador ordenou que quatrocentos soldados o cravassem com
flechas. Mas todas elas ficaram suspensas no ar e nenhuma o pode tocar.
Ora,
o governador, pensando que ele tinha sido morto pelos arqueiros, pôs-se a
insultá-lo. Imediatamente uma flecha se destaca do ar, vai até onde ele está e
fere seu olho, cegando-o.
Cristóvão,
entretanto, diz:
—
É amanhã que eu devo consumar meu sacrifício. Tu farás, tirano, lama com meu
sangue, a esfregarás em teu olho e serás curado.
No
dia seguinte, Dagnus, cuja alma, assim corno seu olho, estava cega, ordena conduzirem-no
ao lugar onde ele devia ser decapitado. Cristóvão faz sua oração, e por fim, um
carrasco corta-lhe a cabeça.
Conversão de Dagnus
Dagnus,
então, curioso pelas palavras que Cristóvão havia proferido no dia anterior,
tomou um pouco de seu sangue misturou um pouco de terra e colocando sobre seu
olho foi curado no mesmo instante.
Mas
um milagre maior se produziu! Curou-se de sua cegueira espiritual. Dagnus
converteu-se e fez um édito por onde qualquer um que blasfemasse contra Deus e
São Cristóvão seria imediatamente punido.
Elogio de Saulo
Ambrósio a São Cristóvão
Santo
Ambrósio elogia São Cristóvão com estas palavras:
Vós
levastes, Senhor, São Cristóvão a um tal grau de virtude, e Vós destes uma tal
graça à sua palavra, que por ele Vós arrancastes do erro do paganismo, para os
conduzir à crença cristã, quarenta e oito mil homens. Nice e Aquiline que desde
muito tempo se entregavam publicamente à prostituição, ele as levou a tomar os
hábitos da castidade e lhes ensinou a receberem a coroa do martírio. Ainda que
atado sobre um banco de ferro no meio duma fogueira ardente, ele não terne ser
queimado por este fogo, e durante um dia inteiro ele não pode ser transpassado pelas
flechas de toda urna soldadesca. Há mais, uma destas flechas fura o olho de um
dos carrascos e o sangue do Bem-aventurado mártir misturado com a terra lhe devolve
a vista, e o tirando da cegueira do corpo, esclarece seu espírito: pois ele obteve
sua graça junto a Vós e rezou suplicando que distanciasse as doenças e as
enfermidades.”
Jacques
de Voragíne- La Légende dorée
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